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07/04/2025 12:12

Rindschleiden



Paraíso, distópico paradoxo.

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Rindschleiden

É um paraíso, lindo de se ver, visitar e parar pra refletir. Sentir a lástima que é perder a guerra demográfica. Eu pesquisei e não encontrei descendentes da família Gricius, a família que viveu por séculos na localidade de Rindschleiden. Outra curiosidade é que as fontes de Rindschleiden deram de beber aos novos brasileiros, emigrantes frustrados. Aproximadamente umas 100 pessoas, dos quais também não se tem notícias de nenhum descendente. Estes novos brasileiros eram hostilizados e o único cemitério, que foram permitido ser enterrados, foi o Rindschleiden.

Não encontrei explicação nem registro histórico. Mas, por dedução, Rindschleiden deve ser Terra de Gado. Na região mais árida do Luxemburgo, Rindschleiden tinha e tem várias nascentes, que formam o Mechelbaach (riacho Michel), afluente do rio Sûre. Diz a lenda que São Wilebrord, padroeiro de Luxemburgo e da localidade, bateu em vários lugares com seu cajado, cada local tocado, uma vertente. Pela presença de água, o gado se concentrava naqueles prados. Por isso Rindschleiden.

Rindschleiden (gado bovino, literalmente) é o lugar mais simpático e emblemático de todo o Luxemburgo. É chamada de aldeia de um homem só. A aldeia parece estar no fundo de um vale, mas está a menos de 40 m de diferença de altitude, do ponto mais alto do país. Deve ter umas 10 construções. Nem o único habitante registrado mora neste povoado (despovoado, no caso).

Existe lá um café/restaurante, que abre todos os dias às 6 horas da tarde, mas fecha sábado e domingo. Tem uma das igrejas mais antigas do país, que remonta aos tempos romanos — século X, o mesmo século da origem do Luxemburgo.

A igreja tem 170 metros de afrescos pintados no teto, datados de 1435. Está rodeada pelo cemitério, onde foram enterrados os mortos do Nei Bresilien, povoado que remonta à maior tragédia da emigração para o Brasil. O assentamento Nei Bresilien estava a 1.500 metros, e os novos brasileiros buscavam a água em Rindschleiden.
Além da igreja e do cemitério, havia um presbítero, a morada do padre, que está integrado ao museu Thillenvogtei, composto por uma grande casa, com a reconstrução da vida rural do século XIX, onde se encontram muitos objetos da família Gricius. Há uma ferraria, estrebaria, barbearia e, mesmo sem ter tido escola, há a reconstrução de uma antiga sala de aula.

Eu fui várias vezes a este simpático lugar e não vi gado por lá. Curioso é que só vi dois porcos — os únicos que vi neste país. Os porcos, com uma aparência de serem de séculos passados.

Inusitado e autoexplicativo é que os últimos moradores foram o padre Jean-Jaques Flemmang e os quatro solteirões, últimos descendentes da família Gricius, que vivia há séculos naquela propriedade, exemplificando o último ato que pintou o retrato da derrota drástica, na guerra demográfica.

A guerra demográfica é fatal, e é urgente enfrentar. Ou em poucas gerações Luxemburgo já era. Investir em armas, defesa e militares não faz sentido. Se for pra ser invadido vai ser. Só deixou de ser, a partir de uma grande ideia, a União Europeia. A cultura militar é preciso acabar e Luxemburgo deveria ser pioneiro. Usar o dinheiro para investir em um bom curso de medicina e bons laboratórios, para estudar e salvar a genética e o povo Luxemburguês. Tentar evitar a derrota demográfica.

Voltando ao Rindschleiden, o proprietário agora é o senhor Jean Neys, que comprou a propriedade em 2002, depois que o último solteirão morreu. Comprou para transformar em museu. O museu e a localidade — quê é um paraíso — são uma viagem para o passado pesado, mas existido, e um futuro paraíso sonhado, talvez nostálgico.

Essa talvez seja a reflexão para a trilha da meditação. O circuito começa na porta da igreja, com uma caminhada de 1.500 metros por 12 estações. O percurso passa por um portal de pedra, no começo da passarela de madeira, sobre o riacho Mechelbaach. Rústicos implementos agrícolas encravados em árvores com carrancas entalhadas e penduradas. Instrumentos sonoros e uma pirâmide. Uma mandala com os pontos cardeais, um portal de madeira com um arcaico instrumento de observação, um impressionante relógio de sol e, na parte em que a trilha contorna a nascente do riacho, um lago com possibilidade de avistar um castor — além de apreciar uma exposição fotográfica. Na penúltima estação, há uma bússola de orientação existencial e, na final, uma bancada com placas de pessoas que aqui jazem, homenagem as pessoas que descansam em paz.




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