26/08/2024 03:55
Aquele dia que os meus passos foram além da utopia.
Aquele dia que os meus passos foram além da utopia.
Passo da São José
Pra acertar o passo e não errar o compasso eu faço a explicação. Passo da São José era uma travessia que dava pé, sobre o rio Santo Antônio, pra quem vinha da Argentina, por uma estrada clandestina, na direção da comunidade da linha São José, interior de Pranchita.
Ao cruzar o passo, nos primeiros passos, passava a Bodega do Seu Gerson Pellin. Na verdade não passava, chegava. Pessoa de bem sempre tem razão pra chegar. Era a bodega do Seu Gerson, mas quem atendia era a Dona Edir (Edir Pelinson Pellin). Bodega, para quem não conhece essa arte, perdeu a melhor parte. Ser Bodegueiro de fronteira é ser selecionado pela excelência. Coragem, paciência e experiência para precaver qualquer situação. O balcão de bodega é um tribunal informal, divã ou anedotário para os mais descontraidos. Balcão confissionário, puído por bem frequentado. Imagina o Bodegueiro na divisa da Argentina. Entrada e saída para ganhar a vida na dura lida de agricultor, safrista, changueiro, domador ou chibeiro. Dois povos hermanados, mas separados por bandeiras e ditadores. Gendameria, exército e polícia, tentando incriminar quem vacilar ou se atrevia a atravessar. Muita gente com poucos recursos e muitas necessidades. E a diplomacia do Bodegueiro, servia de guia ou farol. A bodega é como o coração, responsável pela pulsação da comunidade.
Os tempos hoje são outros. Eu não conhecia esse lugar e nem poderia imaginar, quando um amigo do tempo antigo me convenceu a ir neste lugar, para a inauguração de uma capela. Sentinela e tributo a vigilância da história deste lugar e a quem queira espiar para além. Também homenagem a mãe, Dona Edir e Nossa Senhora Aparecida, para pagar uma promessa. Hora essa, o crédito precede ao credo.
Esse meu relato é pra registrar a grandiosidade da significância e a importância de preservar a cultura e um jeito de viver muito particular. Sou da fronteira seca, no meu caso era a picada, estrada rústica improvisada. Qualquer travessia era uma ousadia. Digo isso para que me entendam que tenho experiência pra falar da significância cultural, deste local.
Fui sozinho, como quem segue a estrela de Belém pra não errar o caminho. A primeira visão daquela capela foi a sensação de ter encontrado uma ponte que me permitiu voltar ao passado. Com a minha emancipação, veio a independência da razão e o distanciamento das religiões. Ao chegar deixei o racional sentar e esperar. Eu não poderia deixar de aproveitar e lhes dar a garantia que ali permanecia o universo de Dom Quixote e a magia de estar vendo miragem, sobre as quais Eduardo Galeano dizia que existem pra nos dar coragem pra caminhar.
Elizandro Pellin, o anfitrião, me recebeu como quem recebe um irmão. Senti a impressão que a muito nos conheciamos. Temos essa ligação de origem fronteira, que forja esse olhar apurado, pra saber o que está passando no outro lado. Com 3 ou 4 palavras ele fez o riscado e eu fiquei alucinado pra conhecer a história que ele dizia que tinha que preservar. Quem ler ou me ouvir não vai entender, é preciso ir lá ver e ter a experiência de fronteira que eu tenho pra compreender a importância daquela estância.
A Estância Passo da São José, a 70 anos aos cuidados da família Pellin/Pelinson, hoje não tem mais bodega. Se dedica a preservar esse modo muito particular de viver. Um tipo de vida que se forja na lida, esculpida pela mão do tempo. O meu encantamento foi ver arte por toda parte. Porque a arte é a parte que completa, quando só a vida não basta. Tem arte moderna nas novas construções. E arte cultural na preservação da arquitetura das antigas construções que abrigam o passado preservado. Arte instrumental. Arte em música e poesia. Arte em literatura ('Vaca Preta em Noite Escura', livro que o Elizandro Pellin escreveu, autografou e me deu, sobre histórias que passou no passado, nas cercanias do Passo). E arte e maestria de cruzar cavalos nativos e chegar ao cavalo Marchador das Araucarias, orgulho da estância Passo da São José. A única raça tipicamente paranaense. O grande vencedor, macho e fêmea, da Expointer e muito mais.
O meu maior respeito é sobre a importância de preservar a significância deste lugar. Lugar que te permite voltar a um passado enraizado, não tem preço. Até os rituais sagrados preservados. A capela, uma arte construída para abrigar rituais culturais, que são a expressão da nossa própria construção.
Fui lá pra conhecer e ficar uma hora, e ir embora. Fiquei o dia inteiro. Nem um temporal me tirou de lá. Só fui embora por respeito a primeira dama. Era seu aniversário, tinha recepção familiar para um jantar de comemoração, e o anfitrião precisava ajudar na organização. Só vi este lugar e essa família, aquele dia. Parti com aquele achado de ter o passado recuperado e a ousadia pra dizer sem medo de errar: nunca conheci, vivi e revivi tanto em um único dia.
Passo da São José
Pra acertar o passo e não errar o compasso eu faço a explicação. Passo da São José era uma travessia que dava pé, sobre o rio Santo Antônio, pra quem vinha da Argentina, por uma estrada clandestina, na direção da comunidade da linha São José, interior de Pranchita.
Ao cruzar o passo, nos primeiros passos, passava a Bodega do Seu Gerson Pellin. Na verdade não passava, chegava. Pessoa de bem sempre tem razão pra chegar. Era a bodega do Seu Gerson, mas quem atendia era a Dona Edir (Edir Pelinson Pellin). Bodega, para quem não conhece essa arte, perdeu a melhor parte. Ser Bodegueiro de fronteira é ser selecionado pela excelência. Coragem, paciência e experiência para precaver qualquer situação. O balcão de bodega é um tribunal informal, divã ou anedotário para os mais descontraidos. Balcão confissionário, puído por bem frequentado. Imagina o Bodegueiro na divisa da Argentina. Entrada e saída para ganhar a vida na dura lida de agricultor, safrista, changueiro, domador ou chibeiro. Dois povos hermanados, mas separados por bandeiras e ditadores. Gendameria, exército e polícia, tentando incriminar quem vacilar ou se atrevia a atravessar. Muita gente com poucos recursos e muitas necessidades. E a diplomacia do Bodegueiro, servia de guia ou farol. A bodega é como o coração, responsável pela pulsação da comunidade.
Os tempos hoje são outros. Eu não conhecia esse lugar e nem poderia imaginar, quando um amigo do tempo antigo me convenceu a ir neste lugar, para a inauguração de uma capela. Sentinela e tributo a vigilância da história deste lugar e a quem queira espiar para além. Também homenagem a mãe, Dona Edir e Nossa Senhora Aparecida, para pagar uma promessa. Hora essa, o crédito precede ao credo.
Esse meu relato é pra registrar a grandiosidade da significância e a importância de preservar a cultura e um jeito de viver muito particular. Sou da fronteira seca, no meu caso era a picada, estrada rústica improvisada. Qualquer travessia era uma ousadia. Digo isso para que me entendam que tenho experiência pra falar da significância cultural, deste local.
Fui sozinho, como quem segue a estrela de Belém pra não errar o caminho. A primeira visão daquela capela foi a sensação de ter encontrado uma ponte que me permitiu voltar ao passado. Com a minha emancipação, veio a independência da razão e o distanciamento das religiões. Ao chegar deixei o racional sentar e esperar. Eu não poderia deixar de aproveitar e lhes dar a garantia que ali permanecia o universo de Dom Quixote e a magia de estar vendo miragem, sobre as quais Eduardo Galeano dizia que existem pra nos dar coragem pra caminhar.
Elizandro Pellin, o anfitrião, me recebeu como quem recebe um irmão. Senti a impressão que a muito nos conheciamos. Temos essa ligação de origem fronteira, que forja esse olhar apurado, pra saber o que está passando no outro lado. Com 3 ou 4 palavras ele fez o riscado e eu fiquei alucinado pra conhecer a história que ele dizia que tinha que preservar. Quem ler ou me ouvir não vai entender, é preciso ir lá ver e ter a experiência de fronteira que eu tenho pra compreender a importância daquela estância.
A Estância Passo da São José, a 70 anos aos cuidados da família Pellin/Pelinson, hoje não tem mais bodega. Se dedica a preservar esse modo muito particular de viver. Um tipo de vida que se forja na lida, esculpida pela mão do tempo. O meu encantamento foi ver arte por toda parte. Porque a arte é a parte que completa, quando só a vida não basta. Tem arte moderna nas novas construções. E arte cultural na preservação da arquitetura das antigas construções que abrigam o passado preservado. Arte instrumental. Arte em música e poesia. Arte em literatura ('Vaca Preta em Noite Escura', livro que o Elizandro Pellin escreveu, autografou e me deu, sobre histórias que passou no passado, nas cercanias do Passo). E arte e maestria de cruzar cavalos nativos e chegar ao cavalo Marchador das Araucarias, orgulho da estância Passo da São José. A única raça tipicamente paranaense. O grande vencedor, macho e fêmea, da Expointer e muito mais.
O meu maior respeito é sobre a importância de preservar a significância deste lugar. Lugar que te permite voltar a um passado enraizado, não tem preço. Até os rituais sagrados preservados. A capela, uma arte construída para abrigar rituais culturais, que são a expressão da nossa própria construção.
Fui lá pra conhecer e ficar uma hora, e ir embora. Fiquei o dia inteiro. Nem um temporal me tirou de lá. Só fui embora por respeito a primeira dama. Era seu aniversário, tinha recepção familiar para um jantar de comemoração, e o anfitrião precisava ajudar na organização. Só vi este lugar e essa família, aquele dia. Parti com aquele achado de ter o passado recuperado e a ousadia pra dizer sem medo de errar: nunca conheci, vivi e revivi tanto em um único dia.